PAULO FEIRE

O MESTRE PAULO FREIRE

Paulo Freire

Entre os títulos que recebeu, estão os de Doutor Honoris Causa em Universidades de vários países, como Inglaterra, Bélgica e Estados Unidos.

Recebendo o título de Doutor Honoris Causa na Universidade Complutense de Madri, em dezembro de 1991. Em baixo, doutoramento na Bélgica.

Recebendo, na Câmara Municipal de São Paulo, o Título Cidadão Paulistano, em 1986.

Com Mário Covas, no recebimento do Prêmio Moinho Santista, em 1995.

Prêmio UNESCO de Educação para a Paz, 1986.

Recebeu prêmios, medalhas, condecorações e títulos em todos os continentes.

Durante boa parte dos anos dos governos militares no Brasil, os seus livros foram proibidos, As suas ideias foram consideradas perigosas e o seu próprio nome foi impedido de ser pronunciado em nossas escolas e universidades. No entanto, ao longo desse mesmo tempo sombrio, e depois dele, poucos brasileiros receberam tantas homenagens e tantos títulos aqui e fora do Brasil. Ao professor Paulo Freire foi concedido o título de Doutor Honoris Causa por quase quarenta universidades do Brasil e de outros países.

De Sul a Norte de nosso país, mais de três centenas de escolas públicas e particulares têm o seu nome.

sábado, 20 de abril de 2013

Parusia








I – DESENVOLVIMENTO



1. O conceito de ParusiaParusia é uma palavra de origem grega, que significa “uma nova vinda ou visita”. Muitas enciclopédias simplesmente definem essa palavra como segunda vinda de Jesus, fazendo jus a uma tradição milenar desse significado. No mundo helenista usava-se para narrar a visita de um rei ou de uma rainha a uma cidade – visita que se desenrola com muita festa, cortejo triunfal e discursos, marcando geralmente o início de uma nova era para região.
Do mundo profano, o termo foi transplantado para o ambiente bíblico, onde aparece na tradução grega do Antigo Testamento, para designar a presença de Deus sob a forma de nuvem, de fogo, de trovão, na Arca da Aliança ou no Templo. Desde o Antigo Testamento tem-se a promessa e a fidelidade de Javé, sempre fiel no seu cumprimento. O Reino de Deus está sempre próximo, e isso perpassa de geração em geração, até chegar a Jesus Cristo que também anuncia que o Reino está próximo.
É porém, no Novo Testamento que essa palavra adquire o seu significado mais típico: de segundo advento do Messias, não mais na obscuridade e no sofrimento, como na primeira vez, mas envolto em poder e majestade, para fundar Seu Reino Glorioso Universal. Conforme São Paulo, essa segunda vinda de Jesus, como a parusia dos antigos reis orientais, será precedido por um arcanjo e sinais de reconhecimento.
Com a morte e ressurreição de Jesus, os judeus experimentaram a “Páscoa do Senhor”; a ressurreição para eles significava os últimos acontecimentos, o final dos tempos. Com Jesus ressuscitado; estava começando esta etapa derradeira, o juízo final de Deus está para vir, como já pregava João Batista; convertam-se de seus pecados, pois o Reino do Senhor está próximo.
A realidade da parusia de Jesus encontra-se testemunhada ao longo de toda Bíblia, dos Profetas (sobre tudo Daniel) aos Salmos, até os quatro Evangelhos, as Cartas dos Apóstolos e o Apocalipse. É, pode-se dizer, a doutrina que mais se destaca nos últimos discursos de Jesus, antes de Sua partida.

2. Parusia – Quando?Como pensava os primeiros Apóstolos?A questão mais intrigante, porém, foi, desde o início, determinar-lhe. Isto é, quando aconteceria essa volta de Cristo ao mundo? Tudo parecia indicar que bem logo, e foi assim o pensamento dos primeiros Apóstolos e Discípulos levavam a viver numa atitude de expectativa, sempre na espera da iminente “Vinda do Senhor Glorioso”, que assim interpretavam as palavras de Jesus: “Em verdade vos declaro: Não passará esta geração antes que tudo isso aconteça” (Mt 24, 34; Mc 13, 30), sem se darem conta que essas palavras se referem à destruição de Jerusalém, profecia que faz parte do mesmo discurso.
As celebrações estavam sempre carregadas de esperanças da vinda de Jesus para terminar a história. Se acreditarmos no retorno de Cristo para arrebatar os bons e punir os maus, estaremos condenando o mundo a sua própria existência. Se tal fato tivesse acontecido nos primeiros séculos do cristianismo, em que mundo estaríamos inseridos hoje?
O martírio dos primeiros cristãos começa a colocar em questão o destino deles, já que Jesus ainda não tinha vindo. A Igreja buscava respostas presentes e não olhava para o céu a espera de Cristo. Por isso ela procura uma forma mais estruturada, oficial, vai buscando para o campo mais doutrinal a perspectiva escatológica.
Desde os primeiros padres apostólicos, a parusia deu margem a largas controvérsias que se estenderam pelos séculos a fora. Não poucos teólogos tentaram desmarcar-lhe a data, apesar das palavras dissuasórias de Cristo: “Não vos pertence a vós saber os tempos e os momentos” (At. 1, 7ª). Mas a incógnita permanecia, já que em muitos textos bíblicos, escatologia e história freqüentemente se confundem. E havia ainda o diferente enfoque dos sinóticos, de São Paulo e de São João, de acordo com a visão eclesial de cada um e das realidades pastorais e existenciais de suas comunidades. Enquanto para os primeiros ela aconteceria por ocasião da derrocada de Jerusalém, para o segundo viria em tempos indefinidos, precedida por uma apostasia geral e pelo aparecimento do “filho da perdição”.
A teologia moderna tem buscado uma nova interpretação desta temática; despede-se da parusia do Senhor no seu sentido apocalíptico e tenta superar uma concepção linear da história a que a parusia estaria no seu ponto terminal. Ou seja, esta parusia dar-se no momento da ressurreição na hora da morte de cada homem.
Este fim está próximo de cada homem, pois o Senhor está sempre vindo. Então a cada dia de nossa existência a vinda do Senhor se plenifica e adquire na morte o esplendor da transparência. Onde esta o fim do mundo numa concepção apocalíptica mais radical? Segundo João Libânio é na morte que a história da liberdade chega a seu fim. É ai que se dá a revelação do Senhor em cada um de nós, a nossa história pessoal vem ao encontro do Senhor Jesus, que vem no esplendor de sua ressurreição acolher quem morre no amor.
Por isso, esse momento se torna revelador, derradeiro e pleno diante do mistério do Cristo Glorioso, em toda sua transparência. Este mistério de Cristo surge como fim, plenitude, vitória ultima sobre a história dos homens em sua morte. – Verdadeira parusia!
A parusia do Senhor não é só salvação. Ela é também condenação, juízo em relação a tudo que significa não-vida, exploração, dominação, injustiça. Por isso, na morte se manifesta – parusia –, uma forma de glorificação e ou condenação.
Na morte–ressurreição de Jesus, o reino de Deus aparece com seu cunho de universal, definitivo e próximo. Na morte de cada um, é o Senhor que aparece para dar essas dimensões ao existir humano ou, mais exatamente, para terminar esse processo de definitividade que atravessa toda a vida humana – a parusia está sempre acontecendo e está próxima.
A parusia da vida é em parte, a da morte é uma totalidade;
A parusia da vida é no espelho, a da morte é face a face;
A parusia da vida é escondida, a da morte é revelada.

3. A parusia da IgrejaNa parusia, a Igreja será manifestada como comunidade de salvação, como a esposa sem ruga do Cordeiro, vencedora do mundo que até então oprimira. A esperança no advento de Cristo é, portanto, somente um ato eclesial como sujeito da esperança cristã sobre o futuro da história, mas é também um elemento objetivo, referindo ao próprio conteúdo da esperança. Esperando em Cristo pela consumação dos tempos, a Igreja espera também sua própria consumação nele.
Sobre a relação Reino e Igreja, ensina o Papa João Paulo II: “Não se pode separar o Reino da Igreja. Certo, esta não tem um fim em si mesma, estando orientada para o Reino de Deus, da qual é germe, sinal e instrumento. Mas, enquanto distinta de Cristo e do Reino, a Igreja está indissoluvelmente unida a ambos. (...) Há uma relação singular única, à qual, mesmo sem excluir a obra de Cristo e do Espírito fora dos confins visíveis da Igreja, confere-se a esta um papel específico e necessário”.
A atual posição da Igreja sobre o fim e a parusia está explicitada no ensino do Concilio Vaticano II, quando recupera o lugar relevante que esta tinha no Novo Testamento. Na Lumen Gentium se recorre a elementos fundamentais da fé cristã primitiva: a atitude vigilante da expectativa da vinda próxima e a parusia como a chegada plena do Reino de Deus.
O tempo da Igreja militante é tempo de expansão, de crescimento a caminho da existência gloriosa em Cristo. A Igreja compreende-se como o corpo místico de Cristo que vive na esperança de uma participação mais perfeita na vida eterna. A parusia representa o momento conclusivo pela qual a Igreja, em Cristo, encontrará o seu pleno cumprimento na participação Sanctorum Communio. Então o advento de Cristo será também a parusia da Igreja.
A espera do esposo não coloca a Igreja à margem do mundo. Ela também não se autocompreende excluídas das realidades terrestre, alienando-se num horizonte maior que se aguarda; tampouco confunde-se com o mundo em suas glórias transitórias e sistemas injustos. A Igreja entende ser o sacramento de Cristo e também o sacramento do mundo. Nela se realiza o encontro vital entre Cristo e toda humanidade. Ela deve ser um sinal visível da vontade salvífica de Deus (cf Jo 3, 16) que se manifesta no seu senhorio e no juízo pelo amor. Na parusia o juízo se manifesta em sua dimensão eclesial. Será o triunfo de Cristo na Igreja e da Igreja em Cristo. É a imagem da Jerusalém celeste, a verdadeira cidade na qual se realiza não só o destino da Igreja-esposa, mas o destino da humanidade inteira, à qual a nova Jerusalém esta aberta.
A contraposição “primeira vinda e segunda vinda” aparece no decreto Ad Gentes, no nº 9, quando se afirma que atividade missionária da Igreja se realiza entre a primeira e a segunda do Senhor. Nesta ultima, a Igreja será congregada, como a messe, no Reino de Deus, desde os quatro ventos. O caráter escatológico da liturgia eclesial aparece na constituição Sacrosanctum Concilium, ao sustentar que a participação no culto entranha a expectativa da manifestação final de Cristo em nossa vida. Até a constituição pastoral sobre a Igreja no mundo de hoje, Gaudium ET Spes, expressa uma atitude de confiança na parusia sem interesse pela data:
“Nós ignoramos o tempo a consumação da terra e da humanidade e desconhecemos a maneira de transformação do universo. Passa certamente a figura deste mundo deformada pelo pecado, mas aprendemos que Deus prepara morada nova e nova terra. Nela habita a justiça e sua felicidade irá satisfazer e superar todos os desejos de paz que sobem nos corações dos homens. então, vencida a morte, os filhos de Deus ressuscitarão em Cristo, e o que foi semeado na fraqueza e na corrupção resvestir-se-á de incorrupção. Permanecerão o amor e a sua obra será libertada da servidão da vaidade toda aquela criação que Deus fez para o homem”.
O Concilio Vaticano II sugere uma continuidade descontínua, uma experiência e uma mudança. Não se fala de aniquilação e destruição, mas de transformação do cosmo e da história. Todo pessimismo cosmológico e antropológico é descartado. Sobre a participação da humanidade na nova criação, o texto conciliar relaciona diretamente os esforços em favor de um futuro melhor para este mundo com a chegada da parusia: “A espera de uma terra nova não deve diminuir, mas sim avivar a preocupação de aperfeiçoar esta terra onde cresce o corpo da família humana, a qual pode de certo modo antecipar o vislumbre do novo século”.
A afirmação que relaciona de forma paradoxal o século presente e o mundo futuro, na Gaudium ET Spes, baseia-se em dois critérios desenvolvidos em parágrafos precedente ao 39. No número 34, o texto destaca que o trabalho humano é uma forma de cooperação na criação de Deus. A atividade humana é compreendida como co-criação. Ora, seria estranho pensar que, chegando à plenitude da criação na parusia, tudo seria destruído e rejeitado, tornando-se supérfluo diante da nova realidade do Reino inaugurado. Confirmando esta perspectiva, o parágrafo 36 diz que a ordem criada goza da autonomia e valor próprios. A criação tem sua própria bondade e verdade. Tudo o que existe, a história e os esforços de uma maior perfeição, não está alheio ao evento parusíaco. Eles serão assumidos e “voltaremos a encontrá-los limpos de toda mácula, iluminados e transfigurados, quando Cristo entregar ao Pai o Reino eterno e universal”.
O Papa João Paulo II reafirma essa relação quando escreve: “Bem sabe a Igreja que nenhuma realização temporal se identifica com o Reino de Deus, porém todas as realizações não fazem mais do que refletir e, em certo sentido, antecipar a glória do Reino que esperamos no fim história, quando o Senhor Vier.
Entre o já e o ainda não da parusia, a Igreja é a expressão dos primeiros frutos do mundo novo, como nos diz São Paulo. Através da Igreja já se contemplam amostras de um futuro que há de vir em plenitude. São os primeiros frutos do que está vindo, mensageiros do futuro que não saciam o presente, mas despertam o desejo da parusia. Isto pode até ser traduzido em analogias com a mulher que se descobre grávida e passa a viver, por antecipação, o filho que vai nascer. A Igreja é a comunidade na qual o futuro assume forma. Nela estão os primeiros frutos do Reino.

4. Uma nova linguagem e melhor compreensãoDe tudo que estudamos sobre o tema da parusia, conclui-se que a expressão “retorno de Cristo” é inadequado para expressar o significado do evento. O Cristo não se ausentou; sua ressurreição inaugurou um novo modo de presença: “Onde dois ou mais se reunirem, eu estarei no meio deles” (Mt 18, 20); “Eis que estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos” (Mt 28,20).
A ressurreição não inaugurou o vazio cristológico na história, nem se proclama que através da parusia retorna o Senhor como um expatriado. a experiência pascal, pelo contrário , confessa uma presença real e atual de Cristo no mundo, significada pelos sacramentos e pela comunidade. A ascensão do Senhor introduziu em sua ausência somente no sentido limitadíssimo da supressão da forma de relação que existia entre o Jesus peregrino sobre a terra e os outros peregrinos com quem ele conviveu. Não cancelou, porém, o sentido de sua presença. Esta ultima, sem mais ser limitada pelos condicionamentos de espaço e de tempo, tornou-se infinitamente mais profunda e intensa. Aquele que virá já veio e paradoxalmente ainda virá. A ascensão, narrada por Lucas em At 1, 9 – 11 demonstra que a falta de experiência direta do Ressuscitado não quer dizer uma mera ausência, indica mais uma “nova presença”, a partir de sua glorificação escatológica. Inaugura um tempo intermediário para a evangelização.
É preciso superar o modelo apocalíptico do Deus ausente do mundo. Conforme a apocalíptica, Deus só se revelará no último dia, no dia do Senhor. Espera-se a sua revelação futura, porque se pensa que ele está ausente. Isto se reflete na atitude de muitos cristãos que, de forma obstinada, mantém a idéia de um fim do mundo no qual se revelará a imagem do Deus oculto. Tal concepção não valoriza o Deus que vem em Jesus Cristo, que já chegou nos dias de Nazareno e continua manifestar sua presença na história. O que não significa sustentar que não ocorrerá a parusia final, que manifestará o futuro absoluto de Cristo.

5. O futuro no presentePaulo definia os cristãos como aqueles que se converteram dos ídolos e que esperam dos céus o Filho Jesus (1 Ts 1, 9 – 10), ou ainda, o cristão é aquele que ama a vinda do Senhor (2 Tm 4, 8). A esperança de “já” haver as primícias do “ainda-não” consumado deveria fazer, dos cristãos , pessoas marcadas pela jovialidade, pelo bom humor e alegria de quem tem motivos para festejar a vida. O horizonte não é mais nebuloso, o futuro está garantido e venceu o sentido sobre o absurdo, a graça sobre o pecado.
Tudo o que caracteriza o pessimismo, o mau agouro, as lamentações e a falta de fé nos ambientes cristão é fruto da perda de sentido da esperança que Cristo abriu em sua ressurreição. Esperar a consumação do ,processo que já se manifestou antecipadamente no ressuscitado é rever o ser e agir no mundo. Todo negativismo que invadiu certos espaços da vida cristã deve ser exorcizado, porque é uma ideologia que desrespeita a essência cristã.
Os cristãos são “paroquianos” no mundo. Os paroquianos eram, no ambiente grego e romano, aqueles estranhos que passavam por algum território, aí se detinham um pouco, para em seguida prosseguirem a caminhada. Com vistas à parusia de Cristo, os cristãos sentem-se estrangeiros que vivem em terra estranha, porque já sabem que existe a pátria verdadeira e degusta as forças do mundo que virá. Vivem numa realidade nova que coexiste na velha. São homens e mulheres novos, apesar do mundo ainda não estar totalmente transfigurado em Cristo. O cristão é pessoa do futuro. A dimensão escatológica da espiritualidade, da ação, dos engajamentos, e responsabilidades é essencial a fé que pretenda ser cristã. Onde se perde a presidência do futuro e a visão da escatologia, decai-se na administração do passado, na institucionalização sem criatividade e repetitiva. Esperar o futuro é já permear o presente de uma força que renova o sentido da vida.

6. Santo Agostinho – Deus e o tempoE repousarei imutável em ti, em tua verdade, na minha forma. No mais tolerarei as perguntas das pessoas que, pela enfermidade que é pena de seu pecado, tem mais sede de saber do que lhes permite sua capacidade, que dizem: “Que fazia Deus antes de criar o céu e a terra?” – Ou ainda: “Como lhe veio à idéia de criar algo, se antes nunca fizera nada?” – concede-lhes, Senhor, que reflitam no que dizem, que compreendam que não se pode falar nunca onde não há tempo. Quando se diz que alguém nunca fez nada, que se quer dizer se não que esse tal nada fez em tempo algum? Que eles compreendam que não pode existir tempo na ausência da criação, e deixem de semelhantes falácias.
Que também atentem para o que tem diante de si, para compreender que tu , antes de todos os tempos, és o Criador eterno de todos os tempos, e que nenhum tempo te é coeterno, nem criatura alguma, embora algumas estejam acima dos tempos.

II – O DEUS QUE VEM – Conclusão Teológica
O dia do juízo, a vinda de Cristo e a consumação do tempo e do espaço são alguns aspectos da fé cristã que, não raras vezes, causam certo desconserto, afetando o sentido da esperança dos cristãos. Isso ocorre porque a fantasia apocalíptica desenvolveu a idéia de que a vinda de Cristo será marcada pela ira, pela vingança e por sinais catastróficos para as pessoas, a história e a criação.
Ao estudo percorrido pela obra de Moltmann nos fazem afirmar que a parusia de Cristo tem a importância fundamental para todo conjunto da fé cristã e, por isso, é essencial e não secundária em toda reflexão teológica. Basta recordar o profundo significado que esta alcançou na fé da Igreja nascente. Infelizmente pudemos constatar como a teologia limitou-se a repetir o artigo da fé, sem desenvolver seu significado. Vimos como a parusia não exerceu, até a época recente, nenhum sério influxo na vivência religiosa dos crentes, nem nas elaborações doutrinais dos teólogos. No entanto, a temática da parusia e sua reflexão é de suma importância para as doutrinas teológicas.
Na abordagem parusíaca é preciso tomar distância deste reducionismo, porque a esperança é uma experiência humana, isto é, temporalmente condicionada e vinculada ao sentido da vida no espaço e na história. Ainda que não tenhamos tudo à luz do dia, e o acesso as realidades divinas ainda seja ofuscado pela neblina de uma aurora que fará despontar o sol da manhã, permanece a certeza de que existe o sol e sabemos de sua luz e calor. Caso contrário, seria esperar algo totalmente desconhecido e estranho à história e revelação de Jesus.
A plenificação da humanidade e do cosmo é o que falta para completar a obra que Jesus Cristo iniciara com sua encarnação, morte e ressurreição. Somente na parusia terá lugar esta consumação. Não podemos pensar, porém, que Deus espere este evento como se houvesse um devir em Cristo. A obra de Cristo está completa, não é ele quem espera, mas é a criação que geme aguardando a parusia. A esperança cristã é firme e infalível se o sentido da história já existe em Deus.
Se for distinto do mundo, do tempo e do espaço, a esperança cristã é aleatória, porque nada nos prova que o determinismo cósmico abarque exaustivamente o futuro e eventualmente o fim da história e da humanidade. Ao afirmar que a nossa espera é aleatória, reconhecemos que temos uma esperança simplesmente humana, expressão de desejos que talvez fracassaram diante da realidade que virá.
Esperar o advento de Deus que se manifestará na parusia é dar lugar à total surpresa de Deus que é, que era e que virá. Antes de sua chegada, porém, Ele “já é”, e não “deve tornar-se”. Aquele que vem já reina e é Senhor, ainda que sua glória não seja reconhecida na terra, onde não foi manifesta universalmente. O tempo de espera para humanidade significa oportunidade para optar consciente e livremente pelo Reino, assim na terra como no céu.

III – O PRIMADO DA ESPERANÇA – Conclusão Escatológica
A conceituação tradicional da esperança, sem olvidar o fato de que a virtude teologal brota do terreno de uma aspiração natural, exprime seu caráter sobrenatural da seguinte maneira: parte de seu objeto transcendente para chegar às modalidades do reflexo do fim da história. Em outras palavras, partindo de um conceito de transcendência, chega-se à imanência: Presença de Deus na Criação. A esperança cristã resume em si o conteúdo da fé cristã e do sentido da história. Não é fruto de uma futurologia otimista, mas é antes o relacionamento com o Criador.
O limite do primado da esperança é o de não ser capaz de equilibrar o “Já” e o “ainda - não” da escatologia. Preferindo o futuro, esta unilateralidade arrisca desvalorizar e negligenciar o peso das modalidades concretas da ação histórica. A escatologia cristã pressupõe tanto a esperança das realidades últimas que se manifestarão na parusia de Cristo, quanto à antecipação já realizada na pessoa do crussificado-ressuscitado para a nossa salvação. A presença de Jesus já atesta a chegada do Reino no meio de nós.
O escatológico já é realidade em Cristo ressuscitado; na sua pessoa deu-se as primícias da ressurreição dos mortos, nele o juízo do mundo já começou, e no corpo transfigurado do crussificado-ressuscitado inaugura-se uma nova ordem cósmica. Uma analogia com a física pode reforçar a idéia da escatologia do final feliz. A vida e o cosmo estão envolvidos num processo dinâmico, num sistema aberto através de relações e movimentos. Dentro do universo existe a lei da entropia, que ensina a tendência de que toda energia tem um desgaste até a morte. Por outro lado, existe a lei da sintropia, através da qual as estruturas vão dissipando a entropia. Da perda de energia há uma renovação de outras realidades, mais generosas, mais vitais e carregadas de propósitos. Ora, se a física ensina esta tendência entropia-sintropia, a Teologia , com outros métodos e conceitos , ensina a doutrina da parusia que não prevê um fim, mas um novo começo.

IV - O ADVENTO DE CRISTO ! – Conclusão Cristológica
O Pai e o Reino constituem o motivo do ser e do agir de Jesus. Jesus vem anunciar o Novo Reino de Deus, que liberta, salva e combate as estruturas de injustiças, impostas pelos poderosos que cai como uma carga muito pesada sobre os ombros do povo pobre e sofrido.
A nova práxis de Jesus que liberta e constrói a esperança para um povo que parece rebanho perdido e sem pastor, provoca e agride o status quo da Palestina, que reage contra a Ele de forma violenta e arrasadora. De repente Aquele que havia sido esperado pelo povo para sua salvação, trás como proposta para o Reino de Deus, a paz e o amor. Até o calvário permanece o silêncio da entrega total ao Pai para que “Venha o Reino”. Esta entrega de Jesus para alguns judeus, denota um sinal de fraqueza, fracasso e vergonha, como poderiam acreditar num messias que se entrega a morte de cruz.
Somente a ressurreição será a confirmação total de tudo quanto Jesus anunciou nos seus dias na carne. O brado da ressurreição ecoou com tanta força que repercute até hoje e repercutirá para sempre. Tudo que se manifestou em Jesus, se realizará na humanidade e no cosmo conforme a promessa da ressurreição de Cristo.
Conforme a palavra do apóstolo Paulo, a criação toda aguarda , com gemidos de parto, a libertação da morte e a plena irrupção do Reino de Deus. A humanidade anseia pelo encontro com seu criador. Porém, este encontro nunca acontecerá se o humano não for ao encontro do divino, e o divino ao encontro do humano. A primeira atitude não condiciona e nem determina a segunda, mas prepara o homem para acolher e favorecer o encontro.
O Cristo, portanto, não aguarda algo para si, mas para a humanidade que chegará a Ele. Como todo mistério cristológico é um ato de amor, de entrega de Deus. Por amor a sua criação, a parusia é então a plenificação e universalização explicita do que já fora consumado.

V – CONCLUSÃO
A ausência da parusia causa aprofundamento da fé
Podemos constatar, no decorrer da história, que a demora da parusia não trouxe para o discurso cristão uma crise insuportável. Pelo contrário. O não - acontecer da segunda vinda do Senhor provocou ampliação do conteúdo da fé.
Dimensões essenciais do discurso teológico precisavam ser repensadas e reformuladas. No fim desse processo se cristalizam de maneira bem clara as seguintes verdades:
♦ Os mortos estarão ressuscitados;
♦ A vinda definitiva de Cristo se antecipa na celebração da comunidade;
♦ A Igreja se constitui como forma temporal dessa comunidade;
♦ Os acontecimentos históricos podem ser compreendidos como processo de encontro progressivo com Cristo ressuscitado.
O que permanece em grande parte marcado pelas antigas concepções apocalípticas, foi à concepção do Juízo Final. A expectativa desse juízo está agora interligada com a idéia da parusia. As interpretações dessa interligação variavam na teologia grega e latina do primeiro milênio; o próprio interesse escatológico oscilava no decorrer da história, mas esta interligação permaneceu. Ela permanece até hoje.

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